sábado, 4 de junho de 2011

O novo século não chegou à universidade



Pierre Lucena é professor de finanças da UFPE.
pierre@acertodecontas.blog.br


Quem visita algumas universidades brasileiras se surpreende com o grau de atraso de suas gestões, muitas delas tomadas pela burocracia e pelo conformismo das administrações. É comum a falta de incentivo à prática do debate, principalmente em suas instâncias superiores. Basta pegarmos como exemplo a pauta de uma reunião de conselho universitário, normalmente tomada por processos banais de afastamento ou de revalidações de diploma. A discussão sobre política universitária foi deixada de lado há tempos.

Nossas universidades se voltaram para os seus meios, relegando seus fins a segundo plano. Estamos imersos em uma teia burocrática e hoje fazemos muito menos do que somos capazes. Perdemos parte significativa de nosso tempo e, consequentemente, da nossa força de trabalho apenas alimentando o sistema burocrático. Na universidade onde leciono, a UFPE, passamos de seis a oito meses para conseguir uma simples progressão funcional.

O professor passa duas semanas acumulando papéis com informações e declarações que já constam no próprio sistema, para depois três colegas de departamento ficarem contando pontos. Depois isso segue para o centro acadêmico, onde mais três professores ficarão contando pontos, para depois seguir para a reitoria, para mais uma comissão de professores ficar somando pontos.

 Nesse processo todo, pelo menos dez professores são envolvidos, desperdiçando horas de trabalho, que não fazem o menor sentido quando temos um sistema de informação. Em algumas instituições, basta um simples clique no computador para isso ser resolvido.

Essa administração voltada para os meios também afeta o técnico administrativo, que hoje se sente extremamente desmotivado, porque sua carreira fica totalmente comprometida, já que os cargos administrativos estão quase todos nas mãos de professores, cujo papel na instituição é outro. Não cabe tirar um professor da sala de aula para que ele exerça tarefas-meio, como realizar licitações e administrar o dia a dia da instituição.

Quando pensamos no tratamento dado a nossos alunos, tudo fica ainda pior. A eles é oferecido o pior ambiente de trabalho dentro das universidades, com salas de aula inadequadas e lotadas, laboratórios antiquados, bibliotecas com poucos livros, filas quilométricas no restaurante universitário e com internet sem fio sendo artigo de luxo. Isso sem falar na maioria da força de trabalho disponível, que normalmente está alocada para servir aos departamentos e não aos cursos e núcleos de pesquisa e extensão.

Ainda vivemos na universidade do século passado, com o espírito crítico desaparecendo aos poucos, dando lugar a processos burocráticos intermináveis, desmotivando a todos. Perdemos o protagonismo das discussões, e parece que muitos dos atuais gestores não se deram conta disso.

Quem acompanha o ambiente universitário percebe que uma minoria ainda resiste a uma mudança efetiva de gestão. Nos centros acadêmicos, alguns grupos de influência ainda estão presentes, e mexer no status quo é algo inaceitável. São pequenos grupos de poder, muitas vezes familiares, em que a prática do fisiologismo ainda não foi abolida, lembrando os feudos da Idade Média. Na prática, o atual poder da universidade é compartilhado com esses grupos, com a participação sendo permitida apenas aos amigos.

É preciso dar uma virada no atual modelo de gestão, compartilhando poder, fomentando o debate e colocando a universidade no século XXI.



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