quinta-feira, 12 de maio de 2016

O transportador marítimo de carga: quem é? Deveres e responsabilidades.



“Transportador” é todo aquele que se incumbe de transportar algum bem ou pessoa de um ponto a outro. Quando o meio utilizado é o marítimo, através de embarcações e navios, o transportador é, obviamente, denominado de “transportador marítimo”.
Logo, o transportador marítimo é aquele que se obriga a deslocar alguma coisa de um lugar a outro, tendo a via marítima como meio operacional.
 
Desde logo, cumpre salientar que transportador marítimo não é exatamente o proprietário da embarcação ou do navio, tampouco o seu armador (aquele responsável pela organização da expedição marítima), mas, sim, a pessoa jurídica que assume, contratualmente, a obrigação de transportar coisas (bens) ou pessoas de um porto a outro.
Para efeitos de responsabilidade civil relativamente à carga, é isso o que basta para esquadrinhar a figura do transportador marítimo.
 
Uma forma simples de se identificar o transportador marítimo, no plano prático, é observar o emitente do conhecimento marítimo, o instrumento contratual que consubstancia o negócio jurídico transporte marítimo.
Será responsável por uma determinada mercadoria (carga) aquele que assina ou emite o instrumento de contrato de transporte marítimo, pouco importando saber quem é proprietário e/ou armador do navio.
Assim, havendo falta ou avaria em um determinado caso concreto, será, perante o proprietário ou segurador da carga, responsável pelos danos havidos a esta aquele que contratualmente a ela se vinculou num dado caso concreto, ou seja, o emitente do conhecimento marítimo.
Nesse sentido, irrelevante, por exemplo, a existência ou não de um contrato de afretamento paralelo ao de transporte marítimo. Este é o que se deve levar em conta diante do cenário exposto ilustrativamente. Aquele outro terá, sem dúvida, suas implicações jurídicas, mas de forma apartada a este.
Costuma-se dizer que o transportador marítimo é quem tem a gestão náutica do navio e que a responsabilidade pelos danos ocorridos a bordo cabe ao capitão do navio.
É preciso ter cuidado com tal posicionamento, pois, hoje (a bem da verdade, há algum tempo), a interpretação que se dá ao tema é diferente.
O capitão é quem tem, verdadeira e exclusivamente, a gestão náutica do navio. Em regra, ele é preposto do armador, personagem que será adiante estudado.
 
Desnecessário dizer que, sendo o “chefe” do navio, o capitão tem inúmeras responsabilidades legais junto a esse navio e a terceiros. Responsabilidades ditadas pela legislação civil ou, mesmo, pelas regras de marinharia, além de normas internacionais.
Sua responsabilidade, no que tange aos atos e fatos da navegação, é em regra apurada, no Brasil, pelo Tribunal Marítimo, com reflexos, logicamente, nos juízos e Tribunais comuns.
 
Não obstante, em termos estritamente jurídicos, vale dizer, em questões processuais, o capitão não é dito como preposto ou funcionário do armador, mas sim como preposto ou funcionário do transportador marítimo, ou seja, o emissor do conhecimento marítimo, diga-se, o responsável pelo transporte.
Quem, portanto, é o verdadeiro contratador do comandante (e de toda a tripulação) é assunto pouco ou nada interessante ao dono da carga ou seu segurador em caso de inadimplemento da obrigação de transporte.
 
Para o dono da carga avariada ou extraviada, o comandante do navio é e sempre será proposto do transportador, não se cogitando a respeito das particularidades de outras situações jurídicas, tais como a efetiva armação do navio, o empregador de fato do mesmo comandante e de toda a tripulação, o fato de o navio ser ou não, total ou parcialmente, afretado e assim por diante.
O transportador responde perante a vítima (passageiro transportado ou consignatário ou segurador da carga confiada para transporte), cabendo, se for o caso, direito de regresso contra o armador ou proprietário do navio, dos quais o capitão é verdadeiramente preposto.
Fácil notar que a questão é tratada de tal e inteligente forma, com vistas a facilitar a vida dos consumidores dos serviços oferecidos pelos transportadores marítimos, razão pela qual harmonizada se encontra a legislação maritimista com a consumerista e, com mais razão, a legislação civilista.
 
Um navio pode ter vários transportadores marítimos, isto é, várias pessoas jurídicas emitentes de conhecimentos marítimos. Eis um motivo pelo qual a vinculação com o capitão, o comandante do navio, não pode ser mais dada como no passado.
O capitão, grosso modo, não é apenas o representante daquele que o contratou ou apenas do armador, mas, sim, de todo aquele envolvido no transporte da carga, especialmente do transportador em sentido estrito, ou seja, aquele que assumiu o dever jurídico de transportar a carga por meio da emissão do conhecimento marítimo.
 
Por isso mesmo que, a rigor, não cabe a denunciação da lide do armador do navio em uma lide forense em que o transportador responde pelos prejuízos decorrentes da inexecução da obrigação de transporte. Igualmente, o chamamento ao processo se mostra absolutamente desnecessário, para não dizer inconveniente ou, mesmo, defeso.
Com efeito, muitos transportadores afretam (cedem em locação) espaços de um navio, senão todo o navio. Assim, literalmente alugam navios ou partes destes para executarem os transportes a que se obrigaram contratualmente. Não são os armadores ou os responsáveis diretos pela tripulação. [NOTA: informações mais detalhadas acerca do contrato de afretamento/fretamento são encontradas na já citada obrada de autoria de Carla Adriana Comitre Gibertoni, talvez a estudiosa que melhor tratou de tal modalidade de negócio jurídico, intimamente ligado ao Direito Marítimo].
 
Se num caso concreto, por exemplo, houver culpa do armador e/ou proprietário do navio, isso é fato absolutamente irrelevante em relação à carga ou ao seguro da carga. A relação jurídica entre o afretador e o fretador do navio deve ser solucionada em uma lide à parte, sem qualquer ônus àquele que se viu obrigado a litigar para proteger seus legítimos direitos e interesses exclusivamente em face do responsável contratual pelo transporte.
A denunciação da lide do armador, muitas vezes com sede em país estrangeiro e sem representação no Brasil, é requerida pelo réu, transportador marítimo, com o objetivo de procrastinar a marcha processual. Daí a necessidade de se impedir a denunciação da lide, manifestamente incabível em casos de Direito Marítimo, ao menos nos moldes em que ora colocados.
Também há de ser destacado que o foco deste trabalho é o Direito e não a logística, o que permite uma interpretação menos engessada a respeito deste que, talvez, assume as vestes do mais importante personagem do Direito Marítimo.
Mas, adentrando um pouco na logística, não se pode falar em transportador marítimo sem se falar em transporte marítimo.
 
Paulo Henrique Cremoneze 
 
 
Fonte: Programa Destaque Portuário | www.destaqueportuario.com.br


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